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Jovens de Periferia: por trás do rótulo de nem-nem

O que significa para os jovens de periferia não estudar nem trabalhar? As estatísticas nem sempre trazem a visão completa das complexidades.
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O estudo Education at a Glance, divulgado no dia 12 de setembro deste ano, mostra que o Brasil registra alto índice de jovens entre 18 e 24 anos que nem estudam nem trabalham, os chamados “nem-nem”: cerca de 24,4% estão nessa situação.

Normalmente esta informação gera reações de pouca empatia por parte daqueles que não conhecem e nunca conversaram demoradamente com os jovens nesta situação. Apontamos o dedo, chamando-os de preguiçosos, desmotivados, casos perdidos. De fato, se enxergamos o mundo como ‘Isto’ ou ‘Aquilo’, não nos aprofundamos na complexidade do ser Jovem hoje, especialmente dos jovens em situação de vulnerabilidade.

Nos últimos anos, convivi de forma intensa com vários jovens que, de alguma forma, fazem parte do amplo universo do Pró. Esse convívio intenso e cotidiano foi fundamental para a pesquisa do meu doutorado. Nesse processo, eles me mostraram a dura realidade, tão desigual e injusta, que é o terreno onde seus diversos projetos e sonhos de vida precisam ser fertilizados para germinar.

Os jovens, de forma transparente e potente, se mostraram Isto e Aquilo:

Sentem-se desamparados porque percebem-se:

…subestimados pela escola
…sem projetos de vida
…com dificuldade de aprender
…em busca de oportunidades
…com necessidade de orientação para vida.

Mas também sonham o Bem Comum e o Bem Viver:

… os sonhos coletivos que quero tanto para mim como para o próximo
…quero que a educação no Brasil melhore para nós pobres e que o Jovem no Brasil tenha seu lugar de voz
…quero ajudar uma causa nobre, influenciar positivamente alguém, fazer algo maior que eu mesmo
…meu sonho é que ainda se tenha esperança na humanidade.
… sei que quero ajudar as pessoas, trazer alegria, mas com qual carreira eu poderia fazer isso?

E a política pública, como está aproveitando essa potência do Jovem, dos seus sonhos coletivos de um mundo melhor?

Os jovens que passam pelo Pró experimentam uma vida coletiva, cuja força dos laços contribui para a fertilização do terreno dos seus sonhos.

Eles experimentam serem ouvidos e experimentam serem reconhecidos em toda sua potência.

Fazemos isso por meio da imersão do jovem na nossa metodologia e, por meio dela, eles aprendem a serem mediadores de leitura e de brincadeira para as crianças das escolas públicas da comunidade, em seus espaços de brincar.

Nesta formação, aprendem a ler e a escrever seus planejamentos deste “recreio”, aprendem a trabalhar em grupo, a criarem brincadeiras, a brincar junto e a serem protagonistas nesta convivência.

Estes jovens recebem seu primeiro salário e com isso transformam o cotidiano em suas casas. Aos olhos dos pais, não são mais preguiçosos nem desmotivados. Ganham um brilho diferente. Um brilho como o da Ana, que precisa ser espalhado para todo Jovem neste país.

A mãe dela me disse:
“Me sinto muito orgulhosa de ver a Ana trabalhando, o povo de Minas fica tudo orgulhoso.”

E a Ana compartilhou conosco o que sentiu ao experimentar o trabalho de mediadora:

“Hoje, no que diz respeito à minha família, me tornei mais responsável. Sinto uma certa liberdade de escolha, agora posso comprar sem precisar pedir nada, além de confiança da parte deles, sobretudo para cuidar do meu irmão. Estou pagando tudo que é para uso pessoal, isso está ajudando minha família financeiramente. Sempre que posso, compro algo para casa, estou interagindo mais com meu irmão.”

Ser jovem em condição de vulnerabilidade é ser potente em muitas dimensões. Não podemos cristalizar nosso olhar para essa condição de nem-nem.

Nossa política pública (e sociedade) precisa enxergar e iluminar essas forças dos jovens e reconhecer tantos futuros possíveis que só precisam de escuta, apoio e oportunidades. E pensar que há 23 anos, Chorão na sua música, dizia: “Eu vejo na TV o que eles falam sobre o jovem não é sério. O jovem no Brasil nunca é levado a sério.

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